sábado, maio 18, 2024

Diário de Viagens


"Como é longa essa viagem de volta. Os fins de tarde sobre o mar e essa passagem do sol poente à lua são os únicos momentos em que sinto o coração mais leve. Terei sempre amado o mar. Ele terá sempre apaziguado tudo dentro de mim." [p. 45]

"Tristeza por me sentir ainda tão vulnerável, daqui a 25 anos, terei 57. Portanto 25 anos para fazer minha obra e encontrar o que procuro. Depois, a velhice e a morte. Sei qual é o mais importante para mim. E encontro, ainda, meio de ceder as pequenas tentações, de perder tempo em conversas vãs ou passeios estéreis. Dominei duas ou três coisas em mim. mas como estou longe dessa superioridade de que tanto necessito." [p. 46]

"Depois do jantar, Dorival Caymmi, um negro que compõe e escreve todos os sambas que o país canta, vem cantar com o seu violão, são as canções mais tristes e mais comoventes. O mar e o amor. A saudade da Bahia. Pouco a pouco, todos cantam, e veem-se um negro, um deputado um professor de faculdade e um tabelião cantarem esses sambas em coro, com uma graça muito natural. Totalmente seduzido." [p. 81]

"Doente. Bronquite, no mínimo. Telefonam para avisar que partimos esta tarde. Faz um dia radioso. Médico. Penicilina. A viagem termina num caixão metálico, entre um médico louco e um diplomata, em direção a Paris," [p. 122]

quinta-feira, maio 09, 2024

Na pior em Paris e Londres

 


"A pobreza as liberta dos padrões usuais de comportamento, assim como o dinheiro liberta as pessoas do trabalho." [p. 09]

"Foi a primeira vez que eu entrei numa casa de penhores francesa. Atravessava-se um grande portal de pedra (com a inscrição, é claro, "Liberté, Égalité, Fraternité" - eles escrevem isso até nas delegacias de polícia)." [p. 25]

"Marcos Cato dizia que um escravo deve trabalhar quando não estiver dormindo. Não importa se o seu trabalho é necessário ou não, ele deve trabalhar porque o trabalho é em si mesmo bom - para escravos, pelo menos. Esse sentimento ainda sobrevive e criou montanhas de trabalho enfadonho e inútil." [p. 131]

"Se perguntarem a um homem rico que seja intelectualmente honesto sobre a melhoria das condições de trabalho, ele dirá algo assim:
                    - Sabemos que a pobreza é desagradável; na verdade, uma vez que é tão remota, gostamos um pouco de nos angustiar com a ideia de sua aversão. Mas não esperem que façamos alguma coisa a respeito dela. Temos pena de vocês, classes baixas, tanto quanto temos pena de um gato com sarna, mas lutaremos como demônios contra qualquer melhoria de sua condição. Achamos que vocês estão muito mais seguros assim como vivem. O atual estado de coisa nos convém e não vamos assumir o risco de libertá-los, nem mesmo de uma hora extra por dia. Então, queridos irmãos, uma vez que vocês devem evidentemente suar para pagar nossas viagens à Itália, suem e que se danem." [p. 132]

"Posso fazer charge sobre qualquer partido, mas não posso pôr nada a favor do socialismo, porque a polícia não permite. Uma vez, desenhei uma jibóia com a inscrição "Capital" engolindo um coelho com a inscrição "Trabalho". Um policial viu e disse: "apaga isso aí e fica esperto". Tive que apagar." [p. 181/182]

"Minha história termina aqui. É uma história bem trivial, e só posso esperar que tenha sido interessante da mesma forma que um diário de viagem é interessante. Posso pelo menos dizer: Aqui está um mundo que espera por você, se você estiver sem um tostão." [p. 239]